sábado, abril 28, 2012

Meus direitos

Eu tenho meus direitos, sabe? Direito a tudo, tudo que eu quiser. Tenho direito a amar, a odiar, a não me importar, a me importar muito, demais. Direito de ficar doente, de ficar de cama, de ficar triste, de explodir de tanta felicidade. Tenho direito de falar ou não bom dia – ainda que você tenha, igualmente, o direito de me classificar ou não como mal-educada –, mas que eu estou no meu direito... Ah, eu estou.
Se eu quiser te pedir pra calar a boca, eu posso. Não tem nada que me impeça – a menos que você seja meu chefe, porque se você for, perder o emprego me impede, sim –, e você tem o direito absoluto de não querer calar a boca. Eu tenho direito de não gostar de você, que é igual ao direito que você tem de não gostar de mim, também. Mas eu repito, eu tenho meus direitos.
Eu tenho direito de estar na minha, tranqüila, na boa. Tenho direito de não ter vontade de sair da cama, tenho direito de não querer sair de casa porque estou com preguiça e, aliás, tenho também o direito de ter essa preguiça. Eu tenho direito de morrer de rir, e tenho direito de ficar quieta e não demonstrar emoção nenhuma, ou de parecer triste ainda que eu não esteja. Eu tenho direito de querer estar só, única e exclusivamente em minha própria companhia.
Dados todos os meus direitos, venho ressaltar o direito que eu tenho de me irritar. Eu tenho, absolutamente, todo o direito do mundo de me irritar caso alguém queira me dizer o que eu tenho ou não que fazer. Caso alguém queira me manipular usando meu psicológico, só porque é um pouco fácil me fazer ceder. Tenho direito a ficar profundamente magoada com quem não entende que eu tenho meus direitos e que eu quero ser respeitada. Se eu não quero falar, eu não falo, saco! Se eu não quero me arrumar pra sentar em um barzinho e ficar jogando conversa fora, eu não me arrumo e eu não saio de casa! Porque eu tenho o direito de não querer sair de casa. E isso não me faz, de maneira alguma, uma pessoa ruim.
E você tem o direito de não querer estar por perto, ainda que jure de pés juntos que gosta de mim e se importa. Eu não tiro seu direito, de maneira alguma. Eu só preciso que entendam que querer estar sozinha, ter preguiça, querer ficar vendo filme debaixo do cobertor em um dia frio ou querer simplesmente ficar deitada lendo um livro não me torna uma péssima amiga, muito menos uma péssima pessoa. Só me torna uma pessoa exercendo o direito de exercer todos os demais direitos. Entendeu?

Preguiça

Dá uma preguiça enorme desse mundo onde a gente vive. Dá uma preguiça enorme de viver no meio dele. Dá preguiça de olhar pro lado e ver tanta gente que mente, que engana – que engana os outros e a si mesmo –, tanta gente querendo ser o que não é! Dá preguiça dessa gente toda rindo numa festa que está um porre porque tá todo mundo de porre e se você não fica de porre também, você é careta ou, no pior dos casos, você se dá conta de que a festa está uma bosta e que não tem como ir embora porque sua carona está gostando da merda toda.
Dá preguiça, porque a gente morre de medo de mostrar nosso lado bom, já que o mundo tá acostumado demais com gente ruim, e quando você mostra a sua bondade, as pessoas esperam isso de você e, não contentes, se aproveitam. Aí você acaba até – olha que absurdo! – se perguntando se você é a única pessoa certa mesmo, ou se o mundo é quem está certo e você está sozinha remando contra a maré. Aí dá mais preguiça ainda.
Dá a maior preguiça de amar alguém, porque ninguém mais sabe criar raízes, ninguém mais sabe amar só por amar. Tem sempre que ter alguma coisa por trás. Ninguém mais sabe amar cem por cento, é tudo sempre muito vago, muito pela metade. Quando a gente se arrisca a amar alguém, tem que fingir ser pela metade também, porque amor, nos dias de hoje, assusta, afasta. Aí, quando a gente se arrisca a amar, dá mais preguiça ainda de pensar no depois, porque todo mundo sempre vai embora. É difícil demais achar amigo que fica, amor que fica, gente que fica. Todo mundo tem preguiça de ficar e criar laços, então vai embora.
No fim das contas, dá o maior medo de sentir alguma coisa. Seja amor, seja paixão, bondade. A gente não pode, nos dias de hoje, sentir nada. E se sentir, não pode demonstrar, porque depois é preciso voltar recolhendo os escombros, e isso dá preguiça demais. No fim das contas, a única preguiça que não me dá preguiça é meu gato preguiçoso.

sexta-feira, abril 27, 2012

O sujeitinho


De repente vem um sujeitinho e fala: “Ame! Se abre pro amor! Deixa rolar!”. Como se fosse fácil. Como se fosse tirar doce da boca de criança. Geralmente esse tipo de conselho é seguido de perto pelo “seja leve”. Seja leve, pelo amor de Deus, s-e-j-a l-e-v-e. Tá.
De repente vem aquele sujeitinho que te vê de longe, não sabe o que você pensa, não sabe o que você sente, não sabe o que existe dentro de você, e descarrega uma centena de regrinhas que você precisa seguir pra amar, pra ser leve, pra conseguir deixar rolar. Como se fosse fácil.
Alguém tem que avisar ao sujeitinho que pra quem não sabe ser leve, um cutucãozinho toma as proporções de um tiro de bazuca. Que quem não sabe ser pela metade sofre dobrado, triplicado. Alguém conta pra ele que dá um medo absurdo de tentar deixar rolar, porque assim a gente ainda corre o risco de simplesmente não rolar. E ai?
E se ser leve não for o suficiente? E se o “deixar rolar” acabe enrolando, se embolando, complicando, e no final não role nada? Quem é que paga o prejuízo? Quem é que paga a conta do terapeuta?
A verdade é que pra ser leve alguém precisa tirar o peso todo que quem não é leve carrega nas costas. Tem que tirar todo o medo, toda a repressão, toda a insegurança. Quem é que consegue ajudar com isso? Amar é fácil, e dos conselhos do sujeito, esse é o único que dá pra seguir. Amar é fácil! "Ser leve" é que são elas.